Quando o Centro Histórico da Cidade de Goiás recebeu o título de Patrimônio da Humanidade, em 2001, os pirenopolinos se alvoroçaram com a possibilidade de também alcançarem tal honraria. Isso aconteceu porque Meia Ponte e Vila Boa sempre foram cidades com intensa rivalidade política, tanto que disputaram quem seria a capital da Província de Goiás.
O incêndio na igreja Matriz em 2002, no entanto, jogou água fria no sonho de Pirenópolis ser incluída na lista do Patrimônio Mundial da Humanidade e abalou profundamente a cidade. A classificação de um local como Patrimônio da Humanidade é feito pela UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Cultura, Ciência e Educação) e visa catalogar, para preservar, locais de excepcional importância cultural ou natural, como patrimônio comum a ser desfrutado por toda a humanidade.
Mercado S. José, na rua Direita, demolido em 2010 |
Não é fácil alcançar o título de Patrimônio da Humanidade, pois os locais que desejam se candidatar devem se encaixar em rigorosos critérios de seleção. O Centro Histórico de Pirenópolis, se encaixaria no seguinte critério: “ser um exemplo de um tipo de edifício ou conjunto arquitetônico, tecnológico ou de paisagem, que ilustre significativos estágios da história humana”.
E para que serve esse título? Entre as muitas vantagens, poderia citar: o status de ser Patrimônio da Humanidade e ter o nome da cidade em catálogos do mundo todo; fomentação de conservação do patrimônio material; e a possibilidade de obter dinheiro do World Heritage Fund para custear a manutenção dos prédios. Se você tem uma casa catalogada, dentro dum conjunto arquitetônico, como Patrimônio da Humanidade, imensas são as possibilidades de angariar fundos para sua reforma e conservação.
Casarão na rua Matutina, desabou em 2010 |
Mas a cada dia que passa, Pirenópolis fica mais longe de conseguir esse título. Digo isso porque sua população ainda não compreendeu a essência da arquitetura dos casarões onde habita. É comum ouvir pessoas que dizem: “a casa está velha, tem que pôr no chão e fazer outra”. Então, do dia para a noite, derrubam o casarão, jogam fora adobe, assoalho de madeira e a estrutura de aroeira. Depois refazem tudo “igualzinho” ao que era antes, só que com tijolo furado, vigas de concreto, telhado de metal, cerâmicas modernas etc. E eu pergunto a você: é o mesmo casarão de antes?
Para exemplificar o que digo, por ocasião de inscrever o Centro Histórico da Cidade de Goiás como Bem Cultural da Humanidade, a UNESCO sintetizou o seguinte parecer: “Goiás constitui um testemunho da ocupação e colonização do interior do Brasil nos séculos XVIII e XIX. Seu desenho urbano é característico das cidades mineras de desenvolvimento orgânico, adaptadas a seu entorno. Ainda que modesta, a arquitetura de seus edifícios públicos e privados apresentam uma grande harmonia, que é fruto, entre outros fatores, de um emprego coerente de materiais e técnicas locais". (UNESCO/BPI)
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Veja bem a importância de se preservar nosso casario tal qual foi edificado. A avaliação da UNESCO diz que a arquitetura dos edifícios, ainda que modesta, apresenta uma grande harmonia devido “ao emprego coerente de materiais e técnicas locais”. Que é isso? São as paredes de adobe, taipa-de-pilão ou pau-a-pique; são o baldrame de areira e o assoalho de tábuas; são as telhas coloniais; etc. Quem joga isso fora, ainda que levante uma casa com semelhança à demolida, não tem mais um edifício histórico, possui apenas uma réplica sem valor.
Antes de pleitear ser Patrimônio da Humanidade, o pirenopolino tem que aceitar que sua cidade possui uma arquitetura simples e frágil, com as paredes sem prumo, o madeiramento tosco, o assoalho de tábuas irregulares. E são essas características que singularizam nosso rico acervo patrimonial. Quem quiser ver formosos palácios de mármore que vá passear em outro locais, aqui em Pirenópolis é tudo muito singelo, sem luxo, modesto.
Casarão em reforma na rua Direita: retiram o teto de madeira e puseram de metal |
Adriano César Curado
Caro Adriano César Curado,
ResponderExcluirAs coisas que fazemos, quer boas ou não, ficam de alguma forma pregadas à nossa existência. Por mais que nos esforcemos, sempre há reminiscências de coisas que emergem para nos lembrar do que fomos ou do que jamais conseguimos ser. A palavra nostalgia nunca expressa tudo o que nos toma quando tentamos tocar o tempo que nos escapou das mãos.
Quem vai a bela Pirenópolis é para conhecer sua história e deliciar-se com a beleza de seus casarões e com a vida simples do povo, que é um povo muito receptivo a quem lá vai!!
Caríssimo escritor,
ResponderExcluirLi o seu texto e ele muito me preocupou. De fato, não é de hoje que venho observando algumas reformas irregulares em Pirenópolis. Tomo como exemplo o velho casarão da Pensão Central em que o atual proprietário praticamente demoliu e deixou apenas a fachada, o resto virou tijolo comum. E há muitos outros exemplos de destruição do patrimônio histórico de Pirenópolis.
Uma cidade que não preserva sua cultura, tal qual ela é, não merece o título de Patrimônio da Humanidade. E mais uma vez eu me reporto às suas palavras para dizer que o pirenopolino tem que entender a essência da cidade.
Sabe o que realmente falta? Educação, no seu mais amplo sentido.
Parabéns pela polêmica postagem.
Eu não sabia que as reformas que tiram os abodes velhor e põem tijolos novos é irregular. Mas se a gente for pensa bem, é errado mesmo. Se pode fazer casa nova em outro lugar, então porque não deixar os casarões em paz!
ResponderExcluirXiiii, isso vai dar pano pra manga!!! De qualquer maneira, quem deveria fiscalizar não é conivente com esse estado das coisas?
ResponderExcluirPor que o poder público responsável não fiscaliza, pune ou orienta os donos de imóveis tombados?
ResponderExcluirNão falta aí uma campanha de esclarimento sobre os limites de intervenção particular no patrimônio que agora é também do povo brasileiro?
De que adianta lançar o conjunto arquitetônico do centro de Pirenópolis no livro tombo, se não cuidam da sua preservação?
E o Ministério Público que é o guardião do direitos difusos e coletivos, onde está?
Esse tema que você abordou só confirma ainda mais um triste evidência: somos um país de faz de conta!!!
É triste quando nossa história é relegada ao nada...
ResponderExcluirSe for mesmo como está postado neste blog, então Pirenópolis nunca vai conseguir o título de Patrimônio da Humanidade!
ResponderExcluirQue vergonha para a atual geração! Tantos anos de preservação do patrimônio para acabar assim nas mãos dos proprietários de hoje!
Realmente, nosso mundo vive uma grande crise moral e faltam homens de verdade.
parece que isso é um problema crônico em todo o estado de Goiás, aos poucos vão sumindo com nossas riquezas e ninguém toma medidas efetivas...
ResponderExcluirA questão são as prioridades. Órgãos que deveriam fiscalizar "todas" as irregularidades, na verdade elegem pontos mais críticos e se dedicam a eles. Fatos de somenos importância (na visão desses órgãos, obviamente), como o casarão que desabou no Beco da Matutina, em Pirenópolis, ficam para escanteio. O resultado das enchentes na Cidade de Goiás, por exemplo, dão mais visibilidade e portanto é prioritário. O resultado dessa política institucional de amostragens é isso que você postou no blog.
ResponderExcluirRapaz, e o pior é que esta destruição acontece no Brasil todo. Estive recentemente em São Luiz/MA e fiquei de queixo caído com a tapera que está virando o centro histórico.
ResponderExcluirFico muito triste com a situação da minha Pirenopolis, apesar de morar em Brasilia amo essa cidade, seu povo e esse ar de tempos antigos. Mas infelizmente moramos em um pais em que orgaos competentes nao tem vontade alguma de explicar para as pessoas tanto de Pirenopolis e de outras cidades historica brasileiras o imenso valor que suas casas, comercios, e sua cidade tem. Vivemos em pais capitalista, em que a sua verdadeira historia esta indo agua a baixo dando lugar ao concreto, ao luxo e a especulação imobiliaria. Sou estudante de Historia e farei meu TCC sobre isso.
ResponderExcluirUm abraço a todos que ainda sabem o real valor da historia.
http://www.namisturadakk.blogspot.com/
Essa história de Patrimônia da Humanidade, só serve para impedir o crescimento e a modernização das cidades. Brasília por exemplo vive engessada, como se estivesse nos anos 60.
ResponderExcluirNão podemos comparar Brasília com Pirenópolis. Uma tem quase 300 anos e a outra 50. Uma possui casarões coloniais e relíquias folclóricas, outra tão-só uma arquitetura duvidosa e discutível.
ExcluirPara mim, Brasília nem deveria ter existido. Sua construção lançou o Brasil numa dívida horrorosa e culminou no Golpe Militar.
Pirenópolis tem condições de se tornar Patrimônio da Humanidade, desde que entre um gestor público com garra para isso.
A solução é entrar um prefeito com garra em Pirenópolis? Ou seja, nunca!
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