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A presidência da República, ao acatar o parecer da Advocacia-Geral
da União, vetou na íntegra o Projeto de Lei nº 4.699/2012, que
regulamenta a profissão de historiador e estabelece os requisitos
para seu exercício.
Conforme
está no projeto, a atividade de historiador somente poderá ser
exercida por quem tem diploma de curso superior, mestrado ou
doutorado em História, ou com linha de pesquisa dedicada à
História. E deixou uma brecha para os diplomados em outras áreas
que comprovem o exercício da profissão de historiador por mais de
cinco anos.
Na
fundamentação do veto, o projeto é ofensivo ao direito fundamental
previsto na Constituição, uma vez que restringe o livre exercício
profissional, além de ofender a previsão constitucional da
livre expressão da atividade intelectual, artística, científica
e de comunicação.
Foi
feliz a presidência ao decidir pelo veto, e acertou na fundamentação
jurídica de sua imposição. A liberdade de expressão está no
artigo 5º, incisos IV e IX da Constituição Federal. O primeiro tem
amplitude maior ao focar na generalidade da livre manifestação do
pensamento. Já o inciso IX trata da liberdade de expressão da
atividade intelectual, artística, científica e de comunicação.
Esses dispositivos legais são importantíssimos, pois buscam
assegurar uma existência digna, livre e igualitária a todos os
habitantes do Brasil.
O
mencionado inciso IX do artigo 5º diz: “IX – É livre a
expressão da atividade intelectual, artística, científica e de
comunicação, independentemente de censura ou licença;”. Com base
nesse enunciado, descobrimos que todos possuem o direito de externar
suas ideias e opiniões das mais diversas formas. E tudo isso
independentemente de essa manifestação se submeter a um controle
prévio, quer por censura, quer por licença.
E é
justamente esse artigo da Constituição Federal que seria
frontalmente atingido, caso o projeto se tornasse lei. Eu dou o
exemplo de uma pessoa de poucos estudos, mas que tem inclinação
intelectual e resolve contar a história do distrito onde sempre
morou. E na base do papel e caneta registra todos os acontecimentos
de que se lembra ou ouviu dizer sobre sua comunidade. Depois faz uma
vaquinha e banca a obra, que é publicada, para alegria dos
estudantes que aguardavam conhecer mais sobre sua região.
No
dia do lançamento do livro, o autor é surpreendido pelo conselho de
classe dos historiadores, que confisca todo o material e ainda o leva
a uma delegacia de polícia por haver infringido o artigo 47 do
Decreto Lei nº 3.688/1941, que diz: “Art. 47. Exercer profissão
ou atividade econômica ou anunciar que a exerce, sem preencher as
condições a que por lei está subordinado o seu exercício: Pena –
prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa, de
quinhentos mil réis a cinco contos de réis.”
O
exemplo acima pode ser endossado com vários exemplos que conhecemos
de pessoas que, alcançada uma certa fase da vida, resolveram
escrever suas memórias. Todas elas ficariam impedidas de publicar
seus livros, pois não seriam inscritas no tal conselho de classe.
Poderiam argumentar os defensores do projeto, numa suposição
hipotética, que basta não assinar como “historiador”, para não
incorrer na contravenção. E eu respondo com uma indagação: vamos
pagar para ver? Basta essa lei entrar em vigor e jurisprudências
para todo gosto e sabor surgirão.
Recentemente
fui ao lançamento de um excelente livro intitulado: “Naqueles
Tempos – Histórias e Causos de Pirenópolis”. A autora é
Marieta de Sousa Amaral, uma mulher que tem a sabedoria da vida,
embora com pouco estudo. Sua obra é excelente, pois narra com
simplicidade a história da cidade de Pirenópolis/GO, onde viveu
seus oitenta anos de existência. No livro, Marieta se autointitula
historiadora, pois de fato o é. Mas se o projeto de lei fosse
sancionado, ela poderia ter problemas legais. Um absurdo!
É
oportuno lembrar, igualmente, dos professores. Não é pouco o número
de formados em outras áreas das Ciências Humanas que dão aula nas
faculdades de História. Na aplicação desse projeto, todos aqueles
que não entram em seus requisitos ficarão de fora dessa docência
acadêmica. Outro absurdo.
O
veto foi publicado do Diário Oficial da União do dia 27/04/2020 e
seguirá para análise em sessão conjunta do Congresso, ainda sem
data marcada.
Adriano
Curado
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