Etelvina e Vânia na casa de Joaquim |
Vou pedir permissão ao meu amigo Lúcio Jacinto para usar
suas fotos e criar este texto. Quero falar sobre as antigas casas humildes de
Pirenópolis que aos poucos desaparecem. É uma pena mesmo. Os casarões que herdamos
da velha Meia Ponte são belíssimos justamente naquilo que os leigos acham feio.
Isso mesmo.
A boniteza de nossas antigas edificações está nas paredes
tortas, pois os construtores de outrora não usavam o prumo. Isso é perfeitamente
notável em alguns muros sem reboco. Parece que vão cair porque envergaram com o
tempo, mas na verdade estão ali há século do mesmo jeito. Isso só para
mencionar as paredes de fora, que têm contato com o tempo. As internas
geralmente são de pau a pique, ou seja, taquaras trançadas e amarradas, e barro.
Os pisos também merecem destaque. Se o morador é pessoa
abastada, entra em casa ao som do assoalho surdo. Se é gente mais humilde, tem no
chão tijolinhos ou então cimento queimado. Já fui em muitas casas de piso de
terra socada.
A estrutura que sustenta a casa não muda. É aroeira mesmo. E
essa madeira tem uma particularidade interessante que é perder aos poucos a cor
avermelhada. Com o passar dos anos a aroeira fica mais esbranquiçada e toma
aquele aspecto de velho que tanto me encanta. Mas basta uma lixa para que o
vermelho vivo reapareça, qual gotas de sangue que as eras ocultaram.
E tem muito mais.
Telhas coloniais, tramela na porta do meio do corredor,
largos tampões de janelas e por aí vai. Merece destaque igualmente a divisão
interna das casas. No geral, quando se entra, há uma porta à esquerda ou direita que dá na sala de
visitas ou no comércio, e passa-se
pela tal porta do meio para chegar ao interior do imóvel. Ali os quartos têm
ligação entre si, uma estratégia para proteger as moças da família.
Mais adiante chegamos a uma varanda, que em Pirenópolis não
tem o significado popularizado atualmente. A varanda nada mais é que um cômodo,
no geral espaçoso, que serve para tomar as refeições. Toda casa meia-pontense tem
também uma cozinha com fogão a lenha e uma despensa para estocar os alimentos.
Sempre foi assim. Desde que os bandeirantes resolveram
acender fogo por aqui as coisas nunca mudaram. Passamos os séculos XVIII e XIX
sem que nossa história fosse perturbada. Mas daí veio o tal século XX e suas
modernidades funcionais. E então muito do que herdamos dos antigos foi ao chão.
Casarões com séculos de história demolidos para dar lugar a casas em estilo
moderno. Há muitos hiatos imobiliários históricos nas principais ruas da cidade
por conta dessa famigerada tendência.
É que a vida moderna requer alguns confortos que as velhas
casas não podem dar. E eu cito banheiros nos quartos, piscinas e por aí vai. Então
a solução é derrubar tudo mesmo para fazer de novo. Mas eu pergunto: por que
não comprar um lote vago, e há muitos por Pirenópolis, para construir a casa
dos sonhos?
E o pior dessa história é que o pesadelo ainda não terminou.
Agora temos a especulação imobiliária que nos assombra e faz com que o metro
quadrado dos imóveis do centro histórico valha fortuna. E o resultado disso é
que os quintais desaparecem aos poucos para dar lugar a construções,
estacionamentos etc. Também tem a questão dos hotéis e pousadas que surgem do
nada e se instalam numa rua outrora tranquila e perturbam a vizinhança. Há critérios
para a concessão de alvarás? Não sei dizer.
Foto é que, aos trancos e barrancos, Pirenópolis ainda
sobrevive. São tantos desafios que surgem que nos custa crer que a cidade os
superará. Mas ela sempre nos surpreende. Quem sabe no futuro - provavelmente
ainda distante - a realidade mude por aqui e ventos melhores assoprem das bandas
dos Pireneus.
Adriano Curado
A casa da foto acima foi derrubada para dar lugar a esta |
As fotografias foram postadas por Lúcio Jacinto no Grupo das Fotos Antigas de Pirenópolis no Facebook.
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