Fogão velho da roça, desses de cimento queimado, encerado de vermelho, da comidinha caseira feita na banha de porco e temperada com alho socado. Ali o feijão borbulha noite inteirinha num caldeirão de ferro e no outro dia tem caldo encorpado e gostoso. Ali a carne de lata se desmancha e colore o arroz soltinho.
No forno do fogão a lenha já está assada a broa de milho, e enquanto o café escalda no coador de pano, já tem meninada em volta da mesa, cotovelos na toalha xadrez e olhares de infância feliz.
No rabo desse velho fogão, já se sentaram muitas gerações de prosadores, conversa que fluía macia, a lembrança acordada pela aguardente do engenho logo ali à frente.
Em dia de festa, espalham-se doces coloridos pelo fogão, queijo fresco do leite das curraleiras paridas, requeijão trabalhado por muitos braços, bolo de fubá fresquinho. Mas em ocasião de luto, rondam por ali homens sisudos, que fumam cigarros de palha e conversam em surdina, mulheres circunspectas e vestidas com discrição.
Passam-se as gerações e o fogão continua lá na cozinha. Vez em quando uma reforminha boba, um reboco acolá, uma nova demão de cera. Nada que comprometa a obra de arte. E em torno dele ficam as recordações das tantas gentes que estiveram ali e já não estão mais.
Adriano Curado
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