sábado, 25 de julho de 2020

Cadê o casarão que estava ali?

Etelvina e Vânia na casa de Joaquim


Vou pedir permissão ao meu amigo Lúcio Jacinto para usar suas fotos e criar este texto. Quero falar sobre as antigas casas humildes de Pirenópolis que aos poucos desaparecem. É uma pena mesmo. Os casarões que herdamos da velha Meia Ponte são belíssimos justamente naquilo que os leigos acham feio.

Isso mesmo.

A boniteza de nossas antigas edificações está nas paredes tortas, pois os construtores de outrora não usavam o prumo. Isso é perfeitamente notável em alguns muros sem reboco. Parece que vão cair porque envergaram com o tempo, mas na verdade estão ali há século do mesmo jeito. Isso só para mencionar as paredes de fora, que têm contato com o tempo. As internas geralmente são de pau a pique, ou seja, taquaras trançadas e amarradas, e barro.

Os pisos também merecem destaque. Se o morador é pessoa abastada, entra em casa ao som do assoalho surdo. Se é gente mais humilde, tem no chão tijolinhos ou então cimento queimado. Já fui em muitas casas de piso de terra socada.

A estrutura que sustenta a casa não muda. É aroeira mesmo. E essa madeira tem uma particularidade interessante que é perder aos poucos a cor avermelhada. Com o passar dos anos a aroeira fica mais esbranquiçada e toma aquele aspecto de velho que tanto me encanta. Mas basta uma lixa para que o vermelho vivo reapareça, qual gotas de sangue que as eras ocultaram.

E tem muito mais.

Telhas coloniais, tramela na porta do meio do corredor, largos tampões de janelas e por aí vai. Merece destaque igualmente a divisão interna das casas. No geral, quando se entra, há uma porta à esquerda ou direita que dá na sala de visitas ou no comércio, e  passa-se pela tal porta do meio para chegar ao interior do imóvel. Ali os quartos têm ligação entre si, uma estratégia para proteger as moças da família.

Mais adiante chegamos a uma varanda, que em Pirenópolis não tem o significado popularizado atualmente. A varanda nada mais é que um cômodo, no geral espaçoso, que serve para tomar as refeições. Toda casa meia-pontense tem também uma cozinha com fogão a lenha e uma despensa para estocar os alimentos.

Sempre foi assim. Desde que os bandeirantes resolveram acender fogo por aqui as coisas nunca mudaram. Passamos os séculos XVIII e XIX sem que nossa história fosse perturbada. Mas daí veio o tal século XX e suas modernidades funcionais. E então muito do que herdamos dos antigos foi ao chão. Casarões com séculos de história demolidos para dar lugar a casas em estilo moderno. Há muitos hiatos imobiliários históricos nas principais ruas da cidade por conta dessa famigerada tendência.

É que a vida moderna requer alguns confortos que as velhas casas não podem dar. E eu cito banheiros nos quartos, piscinas e por aí vai. Então a solução é derrubar tudo mesmo para fazer de novo. Mas eu pergunto: por que não comprar um lote vago, e há muitos por Pirenópolis, para construir a casa dos sonhos?

E o pior dessa história é que o pesadelo ainda não terminou. Agora temos a especulação imobiliária que nos assombra e faz com que o metro quadrado dos imóveis do centro histórico valha fortuna. E o resultado disso é que os quintais desaparecem aos poucos para dar lugar a construções, estacionamentos etc. Também tem a questão dos hotéis e pousadas que surgem do nada e se instalam numa rua outrora tranquila e perturbam a vizinhança. Há critérios para a concessão de alvarás? Não sei dizer.

Foto é que, aos trancos e barrancos, Pirenópolis ainda sobrevive. São tantos desafios que surgem que nos custa crer que a cidade os superará. Mas ela sempre nos surpreende. Quem sabe no futuro - provavelmente ainda distante - a realidade mude por aqui e ventos melhores assoprem das bandas dos Pireneus.

Adriano Curado

A casa da foto acima foi derrubada para dar lugar a esta

As fotografias foram postadas por Lúcio Jacinto no Grupo das Fotos Antigas de Pirenópolis no Facebook.

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