Aqui ainda é a velha Meia Ponte, das minas de ouro de Senhora do Rosário, do rio que nasce ali nas encostas escuras daquela serra e que homenageia as almas - do purgatório, acredito, pois as do céu não precisam mais de homenagens, e as do inferno estão por demais ocupadas com outros afazeres. Enfim, cá por estas bandas é que uns portugueses ambiciosos acharam de batear o rio e depois espetar no chão aroeiras seculares revestidas de adobe e criar esta sequência de casario colado e sem prumo que levam as ruas a seguirem meio cambaleantes história afora.
Nos quintais imensos havia galos (hoje proibidos e multados) e uma infinidade de jabuticabeiras e mangueiras farturentas. Embora ainda assim a molecada preferisse saltar para o quintal alheio porque a fruta furtada é mais adocicada, dizem. E em tempos áureos o que se via por estes becos (ops! hoje não pode mais falar esse nome: são travessas) era o transitar manhoso dos carros de bois ou o tropel dos cascos das montarias. Nada comparado com essas motos infernais que voam baixo ou com esses carros de bastardos infestados de sons automotivos.
Havia disputa de bandas de música e toda família tinha alguém que sabia tocar algo ou cantar afinado. Por agora, no entanto, a escola da centenária Fênix carece de interesse da juventude, embora a audiência dos caixotes televisivos aumente a cada dia.
E depois disso tudo ainda encontro alguém que me aborda e indaga: temos futuro? E o pior é que esse alguém ainda aguarda na esperança de uma resposta animadora. Ora essa, façam-me o favor! O futuro aqui são pousadas nos quintais, galos nas panelas, cenário de casarões, crescentes extorsões turísticas, e ainda um sino gago que ninguém sabe se está soluçando ou anunciando o juízo final.
Mas não é que temos futuro sim! Vamos mandar trazer lá do Engenho de S. Joaquim, com as bênçãos do Padre Simeão, um certo Comendador salvador e encomendar com ele mil dúzias de liberdade para nosso espírito, e ele vai mandar publicar um jornal para encher de brios nosso semblante sossegado e ainda mandar descer o sino gago e dar nele com uma colher de pau suja de doce de leite, porque dizem que isso cura gagueira.
Agora, se o Comendador não quiser ou não puder vir, quem não tiver despertador vai perder o bonde da história, pois os galos já estão servidos para os insaciáveis turistas e não cantam mais.
Adriano Curado
A escola da centenária Phoenix não carece de interesse da juventude, pelo contrário, carece de ajuda financeira. Muitos estão sendo dispensados pois os professores não recebem,e assim sendo não podem pegar mais alunos pois não sabem até onde vai os que lá já estão, e olha que estão fazendo milagre sem dinheiro. Dê uma passadinha lá e observe. De segunda a sexta as 20h o maestro se empenha com seus alunos.
ResponderExcluirCaro amigo Adriano, sempre me emociono com suas palavras. Entendo perfeitamente seu sentimento pela nossa cidade, muito mais sua que minha.
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