terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Construção de dois prédios em Pirenópolis mobiliza comunidade

Os projetos já foram aprovados pela prefeitura e são criticados por colocar em risco o meio ambiente. Um dos condomínios, com 192 unidades, será erguido no centro histórico 

 

Moradores de Pirenópolis (GO) estão mobilizados contra a construção do maior empreendimento imobiliário da região. São dois condomínios de prédios destinados à moradia e ao turismo. Juntos, vão ter 262 apartamentos. Um, com 192 unidades habitacionais, será erguido no centro histórico. Além de destoar do cenário bucólico de ruas e casas centenárias, os edifícios ameaçam o meio ambiente porque os projetos preveem obra em áreas de nascentes e lagos. A denúncia foi feita pelos integrantes do movimento que tenta conter a empreitada. Eles ainda reclamam da redução do fluxo de água e energia, já escassos na cidade de 22 mil habitantes, a 140km de Brasília.

Segundo o movimento Piri Sem Time Share, os empreendimentos foram aprovados sem exigência de quaisquer estudos de impacto ambiental

O nome do movimento, Piri Sem Time Share, remete ao conceito do empreendimento, vendido por cotas ou unidades compartilhadas. Esse tipo de projeto não tem regulamentação própria para concretizar as vendas das unidades fracionadas, abrindo brecha para os construtores aproveitarem-se das legislações de outras modalidades imobiliárias, que, por não serem específicas, não deixam claro as responsabilidades do empreendedor e dos investidores. Os compradores tornam-se coproprietários do mesmo apartamento e as escrituras são feitas em nome de até 52 pessoas na mesma unidade habitacional.

A maioria dos compradores de imóveis compartilhados faz o investimento voltado a aluguéis por temporada. No caso de Pirenópolis, o interesse maior seria o turismo, como acontece com dezenas de prédios de Caldas Novas. As duas cidades goianas estão entre os destinos preferidos dos brasilienses nos fins de semanas e feriados. Mas, de acordo com o Piri Sem Time Share, os time-share não recolhem os impostos da rede hoteleira, pois todos os hóspedes são coproprietários e não pagam diárias.

Impacto

Ainda segundo os líderes do movimento, tais empreendimentos foram aprovados pela prefeitura de Pirenópolis sem nenhum critério de transparência e sem exigência de quaisquer estudos de impacto ambiental. “Enfrentamos falta d’água, de luz, temos problemas com trânsito e de saneamento básico. A cidade não comporta mais tanta gente. Para se realizar turismo de massa tabelado, é preciso ter estrutura”, reclama a empresária Jeanne Caraívas, dona de pousada e líder do Piri Sem Time Share.

A prefeitura liberou os alvarás de construção para os edifícios Estrada Parque dos Pireneus — com 150 apartamentos e potencial de 7,8 mil compradores — e Quinta Santa Bárbara — 192 apartamentos, sendo 64 com dois quartos, no centro histórico. Há cerca de 240 imóveis centenários em Pirenópolis, todos preservados no centro histórico tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em 1988. Outros 250 imóveis também fazem o visitante ter a sensação de voltar no tempo ao andar pelas ruas de pedra do município com mais de 280 anos. Mesmo construídos recentemente, os casarões de fachadas em cor branca, janelões coloridos e grandes portas de madeira têm as mesmas características do ciclo do ouro e dos tempos dos engenhos de cana-de-açúcar.

Alterações

Com um escritório na cidade, o Iphan diz que o processo teve de passar por alterações para atender às regulamentações do órgão de preservação. O projeto original previa um empreendimento com taxa de ocupação de 30% do terreno, o que está fora dos parâmetros do Iphan, que limita a 10% a área construída, no caso de obras novas, em qualquer terreno do centro histórico. A segunda planta apresentada atende à regulamentação, com prédios de dois pavimentos de, no máximo, 8,5 metros de altura.

Diante de tais alterações, garante o Iphan, o conjunto urbano tombado ficará preservado. “Eles (os empreendedores) reduziram a intervenção a um terço do projeto inicial. Mesmo em dois pavimentos, não implicariam na visibilidade do conjunto tombado, ou seja, está dentro dos critérios. É uma ocupação grande para o espaço, mas, se a área e o entorno comportam isso, é dever da prefeitura realizar estudos”, explica Beatriz Otto de Santana, supervisora técnica do Iphan em Goiás.

Tudo pronto


Nem o prefeito nem algum secretário municipal de Pirenópolis quiseram dar entrevista. As explicações ficaram por conta da procuradora municipal, Marciele Ferreira de Paula: “Temos requerimentos de expedição do uso do solo e alvará de construção. Eles atendem à lei municipal de requisitos ambientais e de impactos na cidade. Preenchem os requisitos dos dados. Alguns projetos anexados ainda não foram analisados. Alguns estudos não se fazem necessários ainda, somente quando a construção for lançada.”

Os empreendimentos pertencem a HMS Hotéis e Parques, com sede em Goiânia. No site da corporação, os prédios estão sinalizados como novos projetos. A intenção da empresa é arrecadar R$ 1 bilhão com a venda de cotas dos dois edifícios de Pirenópolis e de outras três obras, uma no interior de São Paulo e duas em Caldas Novas.

Apesar da publicidade e do andamento dos processos na prefeitura e no Iphan, o dono da HMS, Marco Freitas, esquiva-se sobre as construções em Pirenópolis. “O projeto não vingou. Fizemos pesquisas e não há demanda. Esse projeto é de três anos, mas vimos que não teríamos condições para levá-lo adiante”, afirma o empresário goiano.


Abaixo-assinado


O Piri Sem Time Share mantém uma página no Facebook, uma conta no Twitter e um abaixo-assinado em um site internacional, em que qualquer pessoa, de qualquer lugar do mundo, pode se manifestar. Até ontem, a petição havia recebido 540 assinaturas contrárias à construção dos empreendimentos.

O que diz a lei

Audiência pública

O artigo nº 93 do Denatran determina que, para a liberação do alvará de construção de empreendimentos de grande porte, cujas instalações impactem de forma tão direta o município, é necessária a provação de estudos e relatórios previstos em lei federal, como a Lei nº 10.257, de 2001, que criou o EIV e, também, regulamentou os artigos 182 e 183 da Constituição Federal, que estabelece diretrizes gerais da política urbana. Ela deixa claro que os empreendimentos de grande porte, pelos impactos que representam não podem ser liberados antes de serem encerradas todas as exigências legais. E que, obrigatoriamente, deverá ser convocada “a audiência pública para a sua avaliação e aprovação”.
Matéria publicada no jornal Correio Braziliense de 01.12.2015.

4 comentários:

  1. É revoltante!
    Há mais de vinte anos venho dizendo - inclusive em sessões da APLAM ainda na década de 90 - quanto ao tráfego de caminhões pelo centro (isso, parece-me, foi contido) e os avanços dos forasteiros ávidos por faturar o turismo a qualquer custo!
    Vamos reagir com veemência! Não permitamos a "caldas-novização" de Pirenópolis!

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  2. Uma intervenção desse porte exige um estudo aprofundado de impacto junto à comunidade, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico. E para fazer isso tem que contratar uma empresa especializada, fazer estudos, ouvir as gentes etc. São ações que certamente a prefeitura local não tomou. A região do Quinta Santa Bárbara, local de um dos empreendimentos, é conhecida por ter nascentes d’água, e será que esse manancial será preservado? Tanta gente no centro histórico vai gerar aumento significativo de consumo de energia elétrica e água, além de exigir infraestrutura de escoamento do esgoto produzido, e sabemos que Pirenópolis se utiliza das fossas sépticas – buracos no chão. As companhias de saneamento básico e de energia elétrica foram ouvidas e deram parecer favorável, afirmando que comportam mais esse aumento abrupto do consumo?

    Todas essas são questões que têm que ser levantadas antes de se aprovar tais obras. Cabe então ao Ministério Público, tanto federal quanto estadual, já que têm atribuições concorrentes, investigar e acompanhar a aprovação desses projetos.

    É a minha modesta opinião.

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  3. Vou dar uma notícia impactante aos gestores públicos: não cabe mais ninguém em Pirenópolis...! A cidade está lotada todos os dias da semana. As pousadas, os restaurantes, as cachoeiras não dão conta de atender outra leva de gente. E o trânsito? Está engarrafado, entupido de carros com placa de Brasília. Então, infelizmente, os novatos terão que encontrar outro lugar para morar ou passear. Pirenópolis lotou! Esse dois empreendimentos da especulação imobiliária já nascem fracassados porque não vingarão, a cidade não tem base forte o suficiente para abrigá-los. Repito: Pirenópolis lotou! Estou me ouvindo?!

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Adriano Curado