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terça-feira, 31 de maio de 2011

Adeus, Zé Reis! (O de Pirenópolis)

Foto: Luiz de Aquino

     "Aquela é uma das casas da Rua do Rosário que resiste ao comércio. A de número 9, morada preferencial do jornalista José Raimundo Reis da Silva, o nosso Zé Reis – Zezinho, para a família; Zezim, para o bom linguajar goianês, pirenopolês, na intimidade das ruas tortas que abrigavam serenatas nas madrugadas.

     Nos últimos 17 anos, desde quando realizamos as primeiras reuniões para a criação da Academia Pirenopolina de Letras, Artes e Música, a casa do Zé Reis tornou-se, para mim, um ponto de encontros habituais. Mas o sentimento de admiração e amizade surgiu antes. É que, além da profissão, notamos, ambos, algumas afinidades fortes, como isso de gostar de Pirenópolis, de seu casario ligeiramente desalinhado, do perfil íngreme das encostas e o colorido dos portais e esquadrias. Tudo tendo por fundo as histórias da terra e o murmúrio do Rio das Almas.

     O quintal da casa do Zé Reis vai até o barranco da margem esquerda. As janelas da sala e de dois dos quartos escutam o som destrambelhado da Rua do Rosário. Na casa – varanda, cozinha e quintal – tomávamos cerveja e vinho, curtíamos as delícias dos churrascos e trocávamos histórias pitorescas da cidade e de qualquer outro lugar, evocando causos de famílias e de companheiros de trabalho. Ali, também discutíamos coisas atinentes ao modo de vida, fosse o de Pirenópolis, fosse o de Brasília, do Rio de Janeiro ou Caldas Novas, jamais esquecendo coisas do Piauí e das infâncias inesquecíveis.

     Quando, na segunda metade da década de 1990, a Sociedade dos Amigos de Pirenópolis, entidade idealizada por Zé Reis, cuidou da grande obra de restauro da Matriz de Nossa Senhora do Rosário, era ali, na casa número 9 da Rua do Rosário, que conversávamos sobre as novidades. E foi ali que Zezim idealizou e cuidou de correr atrás dos meios para pôr em prática um projeto carinhoso e agradável – Tocando a Obra. Consistia em, no último sábado de cada mês (se não me trai a memória), apresentar-se um conjunto de boa música na nave da Igreja em reparo. Um desses, justo o de 27 de julho de 1998, José Reis ofereceu-me para, aproveitando a exatidão da data, festejarmos o centenário de meu avô, o maestro Luiz de Aquino Alves (saudoso momento em que Clóvis e Bidoro, exímios instrumentistas, e mais meu pai, Israel, ao lado de outros companheiros músicos, executaram composições do meu saudoso avô-xará). A esse evento opôs-se um maestro argentino, então residente na cidade. O “hermano” desconhecia a história e os vultos em questão; dei-lhe nenhuma atenção e, para meu prazer, nunca mais o vi; e para minha vingança, vencemos as equipes esportivas de sua pátria muitas vezes mais, nestes anos após.

     Zé Reis pouco se importava com coisas idas; do passado, ele gostava mesmo era de acumular lembranças boas. Estava, o pequeno gigante da Rua do Rosário, sempre a bolar alguma novidade, ouvir ideias e juntar propostas, apresentar seus sonhos e pôr-se a realizar novos projetos. Para ele, o importante era o agora, que, parece-me, em seu conceito consistia tão-somente em pensar coisas para o amanhã.

     Um dia, veio-lhe o câncer, ele o superou: driblou o tumor cumprindo com esportivo propósito o tratamento. Já convivia, então, com os problemas da pressão arterial. Engordou um tanto, nestes 17 anos. Aprendi a gostar dele pela amizade entre ele e Maria Eunice Pereira e Pina, e com Emílio de Carvalho. Ganhei também essa amizade e cuidei de cultivá-la. E só ganhei, porque aprendi muito com o meu colega e amigo. E dele, também, bem como de Dona Helena, a esposa, herdei a amizade fraterna com seu filho Marcelo e família, meus vizinhos há bom tempo!

     Na manhã de sábado, sua nora Marilene, comadre querida, trouxe-me a notícia triste. Há quase uma semana acompanhávamos a última batalha. O infarto, a transferência de Pirenópolis para Brasília, a internação, os procedimentos, a esperança e, em seguida, o infausto: Zezim se foi!

     Abriu-se o branco, não na memória: no coração. Memorizei a casa branca de portas e janelas azuis, suas arandelas, vitrais em guilhotina, as colunas em madeira; o quintal em dois planos, o verdor das plantas, as sombras das grandes árvores, a parreira... A voz troante e feliz do dono, o sorriso ora cúmplice, ora crítico, da dona da casa, a presença amiga de Marcelo e, eventualmente, de Maurício – mais que de Luciana e José Augusto -, dos netos.... E havia os cães, dos quais cuidei sempre de estar distante por razões óbvias.

     A casa, a de número 9, Rua do Rosário... A casa está em silêncio, agora; é ela das últimas, senão a última, a manter o aspecto exclusivo de morada, pois as outras cederam espaços ao comércio. Não consigo ver, na sala e na varanda, na cozinha e no pátio, o agito dessas últimas duas décadas. A alma da SOAP - a Sociedade dos Amigos de Pirenópolis -, mudou-se de lá, está montando sala nova, ou uma nova varanda, onde por certo conspirará boas coisas com Emílo de Carvalho.

     E nós, os que ficamos, perdemos o rumo, a prosa e muitos planos..."

Fonte: Texto escrito por Luiz de Aquino 
Publicado no blog http://penapoesiaporluizdeaquino.blogspot.com/

sexta-feira, 25 de março de 2011

Saudades da Matriz

 

     Que saudades eu tenho da velha igreja Matriz de Pirenópolis! Falo do templo original, aquele aonde iam meus antepassados para assistir missa, orar em despedida dalgum morto ou participar de festivos casamentos, batizados, crismas etc. Tudo acabou num incêndio que ninguém conseguiu explicar, há quase uma década, e lá se foram o sino fabuloso, a prataria pesada, o altar-mor de custoso entalhe, os altares laterais, o paraíso pintado por Tonico do Padre no teto da capela-mor, os florais no barrado das paredes etc.




     O fogo causou males irreversíveis no interior do  templo, mas as grossas paredes de taipa-de-pilão restaram intactas, assim como as torres e as sacristias. A restauração do prédio por fora ficou perfeita e estão de parabéns seus idealizadores. Seria muito triste Pirenópolis perder esse patrimônio arquitetônico de tamanha importância.


     Mas o interior não está bom. A ideia de instalar na Matriz o altar-mor da igreja do Rosário dos Pretos foi infeliz. Os artesãos da época não fabricaram a peça para um templo das dimensões da Matriz e então sobra um espaço sem sentido nas laterais. E por que não executaram o projeto dos altares laterais? Deixar buracos e terra na parede não me parece correto, pois dá um triste aspecto de obra inacabada.




     Quando a Matriz foi reformada na década de 1990, eu era o tesoureiro da Sociedade dos Amigos de Pirenópolis (Soap) e acompanhei a obra bem de perto. Pude ver que todos os altares foram desmontados, catalogados e fotografados. O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) tem esse material em arquivo. Portanto, há condições técnicas para refazer todos os altares destruídos no incêndio, inclusive o altar-mor.


     O desastre que parcialmente destruiu a Matriz, na minha opinião, deve ser superado. As relíquias que haviam lá dentro podem ser substituídas e a imagem da tragédia apagada da memória dos pirenopolinos. Vamos trabalhar pela conservação da estrutura que restou e foi restaurada, bem como lutar pela reconstrução de todos os altares do templo, inclusive do altar-mor.

Adriano César Curado