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quinta-feira, 30 de setembro de 2010

POÇÃO DA PONTE

Poção da Ponte em 1995


Poção da Ponte em 1985


Poção da Ponte em 1975

     Desfrutei em Pirenópolis, durante a década de 1970, uma infância muito boa. Naquele tempo a cidade era pacata, quase ninguém de fora aparecia e praticamente todos que transitavam pelas ruas eram conhecidos. Visitante mesmo só por ocasião da Semana Santa e da Festa do Divino. Mas mesmo nessas datas festivas era reduzidíssimo o número de turistas, que se hospedavam, principalmente, na Pensão Central e no Rex Hotel, entre sábado e domingo. Segunda e terça-feira era aquele paradão, só o povo da cidade, mesmo.



Poção da Ponte em 1975

     Além de poder jogar bola na rua Nova completamente despreocupado com carros, já que o trânsito naquela época era quase inexistente, minha maior diversão eram os banhos do Poção da Ponte do Carmo.

        E usufruía desse poço por alguns motivos.

     Primeiro porque na barragem da Ramalhuda alguns homens tomavam banho nus, e portanto não era um ambiente recomendável para crianças.

     Segundo porque, mais embaixo, nas Lages, era o lugar de as moças se banharem, e também não ficava bem transitar por lá.

     Terceiro porque, um pouco abaixo do poço, as lavadeiras tinham o hábito de lavar roupas e algumas pessoas banhavam cavalos e lavavam carros.




     Então o negócio era dar um “de ponta” no grande poço que há quase debaixo da Ponte do Carmo. Meu pai e alguns de sua geração, em épocas passadas, obviamente, já saltaram da ponte diretamente no poço. Eu nunca quis arriscar essa estrepolia. Boa decisão, pois na época da juventude de papai o rio das Almas era mais volumoso.







     A água do rio na minha infância era puríssima, dava até para beber, e a gente podia nadar sem receio de que algum esgoto nos fizesse mal. Anos depois, ligações clandestinas passaram a poluir o Almas e o lugar ficou impróprio para banho. Durante décadas, a cadeia pública lançou seus dejetos, pasmem!, diretamente no Poção da Ponte. Está lá até hoje o ca no que fazia esse desserviço social, embora agora se encontre desativado.





     Durante as décadas de 1970 e 1980, era comum acampamentos na região da Beira Rio. Confesso que ficava assustado em ver aquele mar multicolorido de barracas em toda a extensão da areia. Eram verdadeiros farofeiros do Distrito Federal que descobriam Pirenópolis. Chegavam com acampamento completo, traziam cozinha, chuveiro etc. As necessidades fisiológicas aliviavam nos poucos banheiros públicos, nos matinhos ali próximos ou dentro do rio mesmo.


Acampamentos no Poção da Ponte na década de 1970

     Na minha modesta opinião, foi uma acertada decisão a de proibir acampamentos em área pública. Nos dias atuais, quem quiser pernoitar em Pirenópolis sem se hospedar em hotéis ou na casa de parentes ou conhecidos, terá de encarar um camping pago. Esses locais particulares oferecem uma boa estrutura, inclusive com segurança, e portanto não justifica mais ocupar os logradouros públicos.




Poção da Ponte na atualidade

     Contaram-me que, agora, a Prefeitura de Pirenópolis começará uma importante obra de restauração das margens do rio das Almas e creio que incluirão no projeto a limpeza da água. De qualquer forma, a futura rede de esgoto inutilizará o uso das fossas sépticas e com isso preservará tanto o Almas quanto os demais córregos que cortam a cidade, como o próprio lençol freático.



Poção da Ponte na atualidade

     Não sei como está a poluição da água do rio atualmente, mas um pouco abaixo da cidade dá para sentir um forte odor de esgoto. Por outro lado, turistas se banham no Poção da Ponte despreocupadamente, e espero que não sitam nenhuma consequência mais séria.



Poção da Ponte na atualidade

     Sou uma pessoa exageradamente otimista. Acredito que num futuro mais distante, nossa água será pura, será possível bebê-la in natura e sem receio. Experiências bem sucedidas estão por aí, tanto nos EUA quanto na Europa, onde o problema era ainda maior que o nosso.



Poção da Ponte na atualidade

     Então, se deu certo lá, dará aqui também!


Poção da Ponte na atualidade

     O rio agradecerá e as gerações futuras também! Salvem o rio das Almas!

Poção da Ponte na atualidade


Adriano César Curado

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

O CARCEREIRO E O TEMPO

Ah, Pirenópolis! Dos casarões caducos de adobe ressecado, carcomidos pelos séculos que teimam em passar! Das telhas moldadas na coxas escravas, que cobriram a alcova de muitos coronéis! Do fim trágico de matas inteiras de aroeiras, nobre madeirame sepultado em baldrames e colmeeiras!

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Enfileirados ao longo de ruas tortuosas, persistem os casarões ao perpassar do tempo, como se ainda esperassem uma invasão indígena. Seguem de mãos dadas no aguardo, às 21 horas, do toque de recolher do carcereiro da cadeia. Mas o carcereiro não mais está lá, nem a cadeia existe no velho Largo da Matriz






Ali adiante têm muros remendados com as pedras de muitas gerações. E cada povo carrega a pedra que melhor lhe convém, sem bem entender a amplitude do muro que vai edificar. O que será que cerca este muro, Deus meu, além da ânsia de conter a nós mesmos?!







Se no muro há portões que trancafiam nossos sonhos, melhor contornar que saltar, pois a altura do salto, quem sabe, é menor que a da queda. E se em algum época o portão se abrir, não percamos tempo com mesuras sem sentido.




Vamos entrar pela porta que nos convida e desfrutar das benesses de seus anfitriões. Pois ligeiro é o tempo, e afobado o carcereiro. Não demora que tranquem o portão e badalem o sino da velha cadeia.

Prédio da antiga Casa de Câmara e Cadeia de Pirenópolis (o sobrado ao lado da Matriz), cuja construção foi iniciada em 1733, no governo de D. Antônio Luiz de Távora, e que ruiu no início do século XX. No prédio da cadeia antiga havia um carcereiro que, pontualmente, às 21 horas tocava o sino para a mudança da guarda. Com o tempo, no entanto, o pirenopolino passou a associar o toque do sino à hora de se recolher (JAYME, Jarbas. Esboço Histórico de Pirenópolis. Goiânia: UFG, 1971, ps. 131/4).






A atual Casa de Câmara e Cadeia, situada próximo ao Poção da Ponte do Carmo, foi construída a partir de 1916. Depois de desativado o presídio e desocupado o local pela Câmara Municipal (por considerarem o espaço pequeno), o edifício se tornou o Museu do Divino.


by Adriano César Curado

terça-feira, 21 de setembro de 2010

CINE-TEATRO PIRENEUS


Hoje falarei um pouco do famoso Cine-teatro Pireneus. As três primeiras fotos retratam seu estado na atualidade.



O prédio localizado na rua Direita, em Pirenópolis, Goiás, foi construído em 1919 em estilo neo-clássico, para funcionar como teatro, pelo padre espanhol Santiago Uchôa. (1)




Em 1936, a fachada foi alterada para o estilo art-decô, por Antônio Puglisi, estilo artístico de vanguarda da época e mais condizente com a função de edifício destinado a cinema.




Vista da rua Direita na década de 1950
Ao fundo o prédio do cinema


O primeiro filme com som foi “O médico e o monstro” (título original: Dr. Jekyll and Mr. Hyde, estúdio: Metro-Goldwyn-Mayer / Loew's Inc., direção de Victor Fleming, 1941). Havia intervalos para café e fumo.


Nos anos seguintes, o cinema foi o maior sucesso da cidade. Da zona rural vinham pessoas montadas, que pernoitavam na cidade, apenas para assistir a uma exibição.




Cartaz original do filme O Leão do Norte
Última fita exibida no Cine Pireneus


Com a difusão da televisão colorida, novidade gratuita que chegou em muitas casas pirenopolinas, o público se desinteressou pelo cinema, que entrou em decadência, e o Cine Pireneus exibiu seu último filme em 1975 intitulado “Leão do Norte” (Estúdio: Boa Vista Cinematográfica Ltda., direção: Carlos del Pino, 1974). (2)


Sobre esse filme, inclusive, é interessante constar que ele foi lançado nacionalmente no Cine-Teatro Pireneus, na noite de 26 de fevereiro de 1975, e que teve a cidade como locação e contou com vários moradores no elenco. (3)




Fachada atual do Cine Pireneus

Apesar de tombado dentro do conjunto arquitetônico do Centro Histórico de Pirenópolis, isso não impediu que, devido ao abando a que foi relegado, viesse o Cine Pireneus a ruir completamente, ficando de pé apenas sua velha fachada.


Depois de organizar uma parceria com o Governo Federal e a Prefeitura de Pirenópolis, com amparo técnico de IPHAN e patrocínio da TELEBRÁS, a Sociedade dos Amigos de Pirenópolis (SOAP) iniciou a obra de reconstrução do prédio. Optou-se por preservar a fachada original (que até hoje está lá) e construir um prédio novo, mais adequado aos dias atuais, embora com estrutura de madeira e poltronas de couro. A reconstrução do prédio teve início em 1999 e sua inauguração aconteceu em 23 de fevereiro de 2002. (4)




Cartaz original do filme O Médico e o Monstro
Primeiro a ser exibido no Cine Pireneus


Numa parceria entre os governos Estadual e Municipal, foi inaugurado em 2010 o entroncamento cultural, uma área destinada a apresentações artísticas e encontros com esses fins, que inclusive tem um sobrado com bela vista da cidade.




Cortejo do Divino em 1967
Que passou em frente ao Cine Pireneus
Imperador Mauro de Pina


O Cine Pireneus na atualidade também é palco de apresentações musicais durante o Festival Canto da Primavera, que ocorre em Pirenópolis no final de setembro de cada ano.



Cine Pireneus com a fachada original

(1) Jayme, Esboço... (p. 154).

(2) Carvalho, Pirenópolis... (p. 42)

(3) http://cinemateca.gov.br/cgi-bin/wxis.exe/iah/?IsisScript=iah/iah.xis&base=FILMOGRAFIA&lang=p&nextAction=search&exprSearch=ID=024318.

(4) Arquivo da SOAP

(5) http://www.cinemaiscultura.org.br/



Fonte:


CARVALHO, Adelmo. Pirenópolis coletânea 1727 – 2000 – História, turismo e curiosidades. Goiânia: Kelps, 2000.

JAYME, Jarbas. Esboço histórico de Pirenópolis. Vol. I, Goiânia: UFG, 1971


by Adriano César Curado



Alegria, apenas.

No artigo anterior fui obrigado a falar de assunto triste. Mas como sou uma pessoa alegre, falemos hoje de alegria, apenas.

Relembremos nossa querida Pirenópolis. A primeira foto é uma parcial do rio das Almas, para ser mais exato, no poção da Ponte do Carmo.




Este cartaz é uma relíquia, para que gosta de antiguidades. Uma Festa do Divino na década de 1970. O cavaleiro é o Rei Mouro Luiz Armando Pompeu de Pina.




Casarão restaurado na rua Pireneus.


Casarão situado no antigo largo, hoje horrível praça Central. Ao seu lado a Pensão Central.

by Adriano César Curado

sábado, 11 de setembro de 2010

Demoliram o casarão histórico

     Adeus ao velho prédio colonial que por muitas décadas foi o Mercado São José. Lembro-me de quando eu era criança e ia ali comprar óleo vegetal medido numa bomba manual e colocado num vasilhame que trazia lá de casa. O atendente era o senhor Inácio Gomes da Silva, o saudoso Inacinho, que enquanto vivo cuidou bem do velho casarão.



     De uns tempos para cá, no entanto, o prédio começou a virar ruína. Perdeu o telhado e as paredes ficaram com a parte superior cobertas com plástico, para evitar que a umidade infiltrasse nos adobes. Sim, o prédio era todo de adobe e aroeira, numa característica típica das construções do século 19.



     Cheguei a pensar que o imóvel, pela importância histórica para a cidade de Pirenópolis, seria totalmente restaurado, com aproveitamento do madeirame velho e das paredes originais. Já pensou que maravilha os novos proprietários descascarem as paredes e envernizá-las para exposição pública?! Pouca gente tem a sorte de possuir um prédio histórico, e seja lá qual for a finalidade que lhe atribuem, a exploração da imagem do antigo sempre causa bom impacto.



     Mas nada disso adiantou. Passei pelo local no feriado de 7 de setembro e levei um grande susto ao ver que o casarão centenário fora destruído. No lugar das antigas aroeiras estão vergalhões de concreto, e em vez dos adobes originais, agora se veem tijolos furados. Apagaram da noite para o dia um bom naco da história goiana.

      Em pleno século 21, como é possível que um imóvel do patrimônio histórico seja assim destruído? Numa cidade turística da envergadura de Pirenópolis, não apareceu ninguém para gritar pela preservação do prédio?




     Num artigo que publiquei aqui mesmo neste blog (dia 18.7.2010), já alertava para a minha preocupação quanto ao destino do antigo Mercado São José. Mas confesso que não estava preparado para vê-lo demolido.

      Que fazer agora? Nada. Apenas lamentar o ocorrido. É triste constatar que as futuras gerações não conhecerão esse capítulo da história pirenopolina, exceto por fotografias e recordações dos mais antigos.

      Quero que o meu protesto fique registrado nesta página!

Adriano César Curado